Autor: Erwin Hübsch Neto, PY2QI
Reprodução permitida desde que citada a fonte
O QUE É O RADIOAMADORISMO
Em um distante vilarejo da antiga União Soviética um jovem comemora seu primeiro contato feito com um país da América do Sul usando seu próprio equipamento de radioamador, projetado e montado por ele. Estamos em meados da década de 1980 e as rígidas normas do sistema soviético limitam os comunicados a informações como nome, cidade do operador, sinal recebido e temperatura local.
A milhares de quilômetros dali o experiente radioamador sul americano lança o contato em seu livro de registro de comunicados (QSO) e começa a desenhar em sua mente como será a cultura, a vida e o dia-a-dia de seu colega soviético.
A situação descrita acima parece ser inimaginável no mundo atual em que a comunicação é instantânea, por meio da internet, telefone celular, satélites e redes mundiais de televisão. Mas, mesmo nos tempos atuais, todos os dias, milhões de radioamadores continuam se comunicando em todo o mundo, formando uma grande rede mundial de amigos.
Por definição o Radioamador é aquela pessoa que por hobby usa uma estação de radioamador para comunicação sem fins comerciais com outras pessoas que compartilham a mesma atividade. Dependendo do equipamento usado, essa comunicação poderá ser no seu próprio quarteirão ou intercontinental, ou ainda com algum radioamador-astronauta a bordo da Estação Espacial Internacional. A comunicação entre os radioamadores pode ser feita por voz, por meios digitais, usando-se um computador. Muitos radioamadores ainda preferem usar o meio mais antigo de comunicação sem fio: o código Morse, ou telegrafia.
O verdadeiro Radioamador é também uma pessoa interessada em assuntos técnicos e científicos, que gosta muito de fazer experimentações com antenas, aparelhos, montagens, etc. Muitos dos modernos equipamentos de comunicação como o telefone celular e outros desenvolvimentos tecnológicos estão acessíveis a todos graças ao radioamadorismo que permitiu que essas tecnologias fossem desenvolvidas e exaustivamente testadas.
O radioamadorismo teve ao longo de sua história um papel muito importante no auxílio em situações solidariedade, desastres e calamidades públicas em todo o mundo. Há décadas atrás quando as cidades não estavam interligadas por redes telefônicas, era comum o radioamador local servir de apoio em comunicações entre parentes distantes, na obtenção de medicamentos que só eram encontrados em grandes centros ou no exterior. Existem relatos de vidas que muitas vidas que foram salvas graças a solidariedade dos radioamadores na obtenção de medicamentos que não podiam ser encontrados localmente. Apenas para citar um exemplo da importância dessa atividade como meio de comunicação em situações de calamidade e emergências, os radioamadores formaram uma rede nacional de comunicação quando das grandes enchentes nos anos de 1983 e 1984 no estado de Santa Catarina, onde por vários dias dezenas de importantes cidades ficaram totalmente isoladas e devastadas, sem nenhuma outra forma de comunicação. Mais recentemente os radioamadores americanos participaram ativamente como uma rede de comunicação de emergência durante os ataques terroristas de 11 de Setembro.
O radioamadorismo possui um código de ética que foi escrito em 1928 pelo Radioamador americano Paul M. Segal, W9EEA:
1) PONDERADO - O Radioamador é ponderado e atencioso e jamais usará sua estação para prejudicar a atividade dos demais;
2) LEAL – O Radioamador é leal e oferecerá sua lealdade, encorajamento e apoio aos seus companheiros, ao seu clube local e à sua entidade que o representa em seu país;
3) PROGRESSISTA – O Radioamador é progressista e manterá sua estação sempre atualizada tecnologicamente, conservada e bem instalada e operando com eficiência;
4) AMISTOSO – O Radioamador é amigo e paciente com os demais colegas, principalmente se forem iniciantes. Aconselha e auxilia os principiantes. Presta assistência e colaboração. Considera e coopera com o interesse alheio. Estas são as características do espírito do radioamadorismo;
5) EQUILIBRADO – O Radioamador é equilibrado. O rádio é seu passatempo e ele nunca permitirá que o seu hobby interfira em quaisquer de seus deveres e obrigações domésticas, profissionais, escolares ou para com a comunidade em que vive;
6) PATRIÓTICO – Sua estação e o suas habilidades sempre estão disponíveis para prestar serviço ao seu país e sua comunidade.
HOBBY DE DIVERSIDADES
Se você ainda não é um Radioamador, não tem idéia de quantas atividades incomuns e interessantes poderá fazer. Quais são os tipos de pessoas que encontrará? Se você caminhar pelas ruas de sua cidade certamente encontrará pessoas de todos os tipos, homens, mulheres, pessoas de diferentes idades, classes sociais, etnias e religiões. Eles podem ser engenheiros, donas de casa, motoristas, policiais, bancários. Mas qualquer um deles pode ser um radioamador que sem querer você poderá manter contato via rádio.
O Radioamadorismo é um hobby democrático, que não tolera discriminações sociais, raciais ou políticas. Pouco importa para o Radioamador se seu colega do outro lado não compartilha das mesmas crenças ou orientações políticas e muito menos se ele é de uma ou outra raça. O radioamadorismo forma uma imensa comunidade mundial onde as diferenças não existem e o que importa é que todos tenham o mesmo interesse comum.
Como Radioamador você poderá ter inúmeras opções de atividades e interesses. Existem radioamadores que tem uma licença classe C e se dedicam apenas a falar localmente nas faixas de VHF e UHF num raio de apenas 100 ou 200 quilômetros. Outros preferem operar com equipamentos de HF que permitem contatos a milhares de quilômetros. Muitos radioamadores gostam de montar suas próprias antenas, fazer experiências com novos circuitos e até mesmo montar seus próprios equipamentos. A operação de rádios de baixa potência chamada de QRP fascina muitas pessoas que enxergam a limitação de potência como um desafio. Falar com outras pessoas usando o antigo Código Morse é algo que ainda fascina milhares de radioamadores em todo o mundo, bem como aqueles que gostam de fazer contatos em RTTY (Radioteletipo) ou em modos digitais usando um computador acoplado ao rádio. O radioamadorismo permite ainda contatos via satélite (sim, existem diversos satélites exclusivos para uso de radioamadores), contatos através de reflexão lunar (o sinal é “rebatido” na superfície da Lua) ou você poderá até manter contato com radioamadores na Estação Espacial Internacional (a maioria dos astronautas é Radioamador).
Se você tem outros hobbies como a prática de off-road, rallies, navegação ou adora fazer uma trilha de “bike” pode dotar o seu veículo de um moderno equipamento de radioamador que lhe trará mais segurança e companhia em suas longas aventuras.
COMO TUDO COMEÇOU
Podemos afirmar que os dois primeiros Radioamadores foram o italiano Guglielmo Marconi, que detém o título de inventor do rádio e o brasileiro Padre Roberto Landell de Moura. Ambos tiveram êxito com experimentos rudimentares do que chamamos hoje de rádio entre o final do século XIX e início do século XX. Padre Landell conseguiu realizar transmissões de sinal na cidade de São Paulo, anos antes de Marconi ter conseguido o registro da patente do rádio.
Marconi fundou na Inglaterra a “The Marconi Company” e com investimento de outros empresários continuou suas pesquisas transformando sua invenção num grande negócio chamado de rádio. Já o brasileiro, sem apoio e perseguido, jamais explorou seu trabalho de forma comercial.
Pouco a pouco muitas pessoas começaram a se interessar pela comunicação à distância e começaram a montar seus rádios e antenas vindo a ser o que chamamos hoje de Radioamador. Nessa época, início do século XX, não existia nenhuma regulamentação por parte dos governos. Em 1914 foi fundada a primeira liga de radioamadores nos Estados Unidos, chamada de ARRL (American Radio Relay League). A ARRL foi incumbida a estabelecer normas para que o radioamadorismo pudesse ser reconhecido como uma atividade legal. A atividade foi liberada e reconhecida pelo governo americano no dia 1º de outubro de 1919. Em 1920 conferências internacionais estabeleceram critérios e normas para a nova atividade, incluindo a definição das freqüências de operação.
Os primeiros registros da atividade no Brasil datam de 1909 cotando com radioamadores nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná. Nessa época, sem qualquer legislação ou normatização, os próprios radioamadores atribuíam a si mesmo uma sigla (prefixo) de identificação.
No ano de 1926 foi fundada no Rio de Janeiro a Revista Antenna, a mais antiga publicação sobre radioamadorismo em língua portuguesa. A revista atingiu seu auge sob o comando do radioamador e jornalista Gilberto Affonso Penna, PY1AFA.
A Liga Brasileira de Radioamadores (LABRE www.labre.org.br), a única entidade nacional que representa os radioamadores do começou como entidades separadas no ano de 1931, uma em São Paulo e outra no Rio de Janeiro. Foram fundidas em 1934, dando origem a atual LABRE.
2. COMO ME TORNAR UM RADIOAMADOR?
No Brasil, o Serviço de Radioamador é regulamentado e fiscalizado pela ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações). A Norma 31/94 estabelece as condições para execução do Serviço de Radioamador, bem como as exigências para se conseguir o COER (Certificado de Operador de Estação de Radioamador) e da Licença de Estação de Radioamador.
A definição oficial dessa atividade pela agência é a seguinte:
“O Serviço de Radioamador é modalidade de serviço de radiocomunicações, destinado ao treinamento próprio, à intercomunicação e a investigações técnicas, levadas a efeito por amadores devidamente autorizados, interessados na radiotécnica a título pessoal que não visam qualquer objetivo pecuniário ou comercial ligado à exploração do serviço, inclusive utilizando estações espaciais situadas em satélites da Terra”.
Muitas pessoas confundem essa atividade com outras similares. Uma estação de Radioamador é, por exemplo, diferente de uma estação da Faixa do Cidadão, popularmente conhecido como “PX”. Para se obter uma licença de “PX” basta que se faça um cadastro e que seja recolhida uma taxa para a Anatel. Para se tornar um Radioamador, é necessário que o candidato preste alguns exames de conhecimento geral e técnico. Além disso, outra diferença fundamental entre uma estação de Radioamador e uma estação de 11 metros (“PX”) é que um Radioamador pode utilizar diversas faixas de freqüência (bandas) enquanto um operador da faixa do cidadão só pode usar uma banca (a faixa de 27 MHz).
O termo Radioamador é usado erroneamente para denominar qualquer pessoa que esteja usando um rádio para se comunicar. Um caminhoneiro que use um rádio para se comunicar não é necessariamente um radioamador. Pode ser um operador da Faixa do Cidadão (11 metros), um operador de rádio de Serviço Comercial Privado ou, muitas vezes um clandestino, usando um rádio sem licença e de forma totalmente irregular, como infelizmente é muito comum em nosso país. Um fazendeiro que utiliza um equipamento de rádio da mesma forma não é necessariamente um Radioamador, pois a Anatel concede licenças específicas para pessoas que tenham necessidade de comunicação rural.
Nos últimos tempos até a imprensa tem usado o termo Radioamador para denominar qualquer pessoa ou empresa que esteja usando um equipamento de rádio. Quem já não leu nos jornais que “a polícia prendeu uma quadrilha que estava usando radioamador para se comunicar?” Ou ainda que determinada empresa usa “radioamador” para contato com seus caminhões. Portanto, temos que tomar cuidado para não usar o termo de forma incorreta. É importante conhecer o significado correto de alguns termos para evitar confusões:
Radioamador – É a pessoa física que se utiliza de uma estação de radioamador para realizar contatos via rádio.
Estação de Radioamador – É o conjunto de equipamentos e antenas necessários para que o radioamador possa se comunicar com outras estações.
Prefixo – Forma popular que se denomina o Indicativo de Chamada. O Indicativo de Chamada é um conjunto de letras e números atribuído de forma lógica e organizada pela Anatel a um Radioamador, de forma que ele possa ser identificado por outras estações em qualquer lugar do mundo.
PY – É a forma popular e errada usada para dizer que “tal pessoa é um radioamador”. Na verdade PY é um dos prefixos que formam um indicativo de chamada atribuídos ao Brasil pela UIT (União Internacional de Telecomunicações).
Por exigência de leis internacionais e nacionais que regulamentam o radioamadorismo, é necessário que o interessado em se tornar um radioamador preste um exame com grau de dificuldade diferente para cada uma das três classes. Os exames são aplicados pela ANATEL em parceria com a LABRE (Liga Brasileira de Radioamadores) em cada estado. Normalmente a LABRE divulga o calendário de exames em seu site na internet.
Se você pretende ter uma estação de radioamador de custo mais baixo, apenas para comunicados locais e a curta distância (até não mais que 200 km) poderá optar por tirar uma licença de classe C, que lhe permitirá ter rádios de VHF ou UHF que tem custo mais baixo. Esses rádios podem ser instalados em sua casa ou em seu carro. Normalmente essa é a opção das pessoas que procuram o radioamadorismo como um complemento a outras atividades, como em veículos de rally e trilhas. O radioamador da classe C poderá ainda operar em algumas faixas de HF que permitirão contatos a maior distância (500, 1000 km ou eventualmente até bem mais que isso). Nesse caso os equipamentos são bem mais caros e as antenas necessitam de grande disponibilidade de espaço.
Caso você pretenda ser um radioamador mais avançado, que pretenda ter uma licença para contatos internacionais e em bandas de freqüências que permitam esses contatos, deverá começar pela classe B. Após um ano licenciado na classe B poderá prestar exame para a classe mais avançada (A).
Fonte:http://www.radiohaus.com.br/pagina.php?cod=27